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16 de Abril de 2024
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    O voto do Ministro Gilmar Mendes no habeas corpus do ex-presidente Lula

    há 6 anos


    Íntegra do voto do ministro Gilmar Mendes no habeas corpus do ex-presidente Lula

    HABEAS CORPUS 152.752 PARANÁ RELATOR : MIN. EDSON FACHIN PACTE.(S) :LUIZ INACIO LULA DA SILVA IMPTE.(S) :CRISTIANO ZANIN MARTINS E OUTRO (A/S) ADV.(A/S) :LUIZ CARLOS SIGMARINGA SEIXAS ADV.(A/S) :JOSE PAULO SEPULVEDA PERTENCE E OUTRO (A/S) COATOR (A/S)(ES) :VICE-PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    Resultado de imagem para ministro Gilmar Mendes

    V O T O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES – Senhora Presidente, tem-se aplicado o entendimento inaugurado pelo Supremo Tribunal Federal no sentido de que a execução provisória da sentença já confirmada em apelação, ainda que sujeita a recursos especial e extraordinário, não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência, conforme decidido no HC 126.292/SP. Cumpre ressaltar, desde logo, que em momento algum daquele julgamento foi dito que, confirmada a condenação em segunda instância, o início do cumprimento da pena privativa seria impositivo. Sempre se disse que era uma possibilidade. Por isso, quero começar o voto fazendo uma breve retrospectiva do tema. Inicialmente, a posição do STF era pela aplicação estrita do CPP, tal qual então vigente, permitindo a prisão decorrente de condenação, em especial, na pendência de recursos extraordinários – RHC 71.959, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, redator para acórdão Min. Francisco Rezek, julgado em 3.2.1995. Em 2009, esse entendimento foi revisto. Em habeas corpus, o Pleno avaliou se o art. 637 do CPP, o qual afirma que o recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, sustentaria a prisão, com a confirmação da condenação em grau de apelação. Por maioria, em julgamento concluído em 5.2.2009, o Pleno do STF firmou a posição de que a prisão somente ocorreria após o trânsito em julgado da decisão condenatória. Eventual ordem de prisão anterior teria caráter cautelar e, em consequência, deveria estar embasada em sua necessidade imediata, sob pena de violação à garantia de presunção de não culpabilidade – HC 84.078, Pleno, Rel. Min. Eros Grau, julgado em 5.2.2009. A questão foi novamente revisitada em 2016. Em julgamento de habeas corpus, o Pleno entendeu que “a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não comprometeria o princípio constitucional da presunção de inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal” – HC 126.292, Rel. Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 17.2.2016. Naquela oportunidade, ficaram vencidos os Ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. A decisão foi confirmada em embargos de declaração, nos quais se alegava omissão no cotejo do caso com o art. 283 do CPPHC 126.292 ED, Rel. Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 2.9.2016, sendo esta a ementa: “CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. , LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo , inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado”. Esse posicionamento foi reiterado na decisão que indeferiu a medida cautelar em ações declaratórias de constitucionalidade do art. 283 do CPP, cujo teor dispõe que “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”. O Tribunal, então em sede de cognição sumária, entendeu que o dispositivo devia ser lido em conjunto com as demais normas legais, que negam efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial, notadamente o art. 637 do CPP – ADCs 43 e 44 MC, Relator Min. MARCO AURÉLIO, redator para acórdão Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 5.10.2016. Por fim, o Plenário virtual reafirmou, em sede de repercussão geral (tema 925), em recurso extraordinário, o entendimento de que o cumprimento das penas após o julgamento por Tribunal seria juridicamente viável – ARE 964.246, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 11.11.2016. Assinalo, pois, que a execução antecipada da pena de prisão, após julgamento em 2ª instância, na linha do quanto decidido por esta Corte, seria possível. Porém, essa possibilidade tem sido aplicada pelas instâncias inferiores “automaticamente”, para todos os casos e em qualquer situação, independentemente da natureza do crime, de sua gravidade ou do quantum da pena a ser cumprida. Nesse ponto, importante resgatar a linha de argumentação que desenvolvi no paradigmático HC 126.292, quando destaquei um importante precedente de relatoria do Ministro Eros Grau (HC 84.078), no qual o Ministro Cezar Peluso ressaltava a importância ou a possibilidade da prisão provisória a partir dessa decisão de primeiro ou de segundo grau, desde que presentes os requisitos de prisão preventiva. Dizia eu, então, que havia casos clássicos enquadráveis no fundamento de ordem pública que poderiam ensejar a antecipação da execução da pena. A possibilidade, por exemplo, de uma iteração ou reiteração delitiva. Era uma hipótese que se colocava como plausível para justificar a prisão preventiva a partir da decisão de primeiro ou de segundo grau. Consignei que, em nosso sistema jurídico, seria possível dispensar ao acusado tratamento progressivamente mais gravoso, conforme a evolução da imputação. Citei o exemplo das “fundadas razões” do art. 240, § 1º, do CPP para autorizar busca domiciliar. A prova da materialidade e os indícios da autoria seriam suficientes para tornar réu o investigado (art. 395, III, do CPP). Para condená-lo, imperiosa a prova além de dúvida razoável. Nesse diapasão Eduardo Espínola Filho afirma que “a presunção de inocência é vária, segundo os indivíduos sujeitos passivos do processo, as contingências da prova e o estado da causa” (ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado, Volume III. Campinas: Bookseler, 2000. p. 436). Portanto, não estamos diante de uma regra que se resolve na fórmula de tudo ou nada, mas de um princípio passível de conformação, sendo natural à presunção de não culpabilidade evoluir-se de acordo com o estágio do procedimento. Desde que não se atinja o núcleo fundamental, o tratamento progressivamente mais gravoso seria aceitável. Ainda que a condenação não tenha transitado em julgado, as instâncias soberanas para análise dos fatos já se teriam pronunciado pela culpabilidade. Com efeito, após o julgamento da apelação, esgotam se as vias ordinárias. Subsequentemente, caberiam apenas recursos extraordinários. Estes, como se sabe, têm sua fundamentação vinculada a questões federais (recurso especial) e constitucionais (recurso extraordinário) e, por força da lei (art. 637 do CPP), não têm efeito suspensivo. A análise das questões federais e constitucionais em recursos extraordinários, ainda que decorra da provocação da parte recorrente, serve preponderantemente não ao interesse do postulante, mas ao interesse coletivo no desenvolvimento e aperfeiçoamento da jurisprudência. Superadas as instâncias ordinárias com condenação à pena privativa de liberdade não substituída, tem-se uma declaração, com considerável força de que o réu é culpado. Nasce um título condenatório, ainda que precário e sujeito a mudanças, passível de execução, atendidas certas condições que foram tangenciadas em meu voto no aludido precedente (HC 126.292). De conseguinte, nesse estágio de gradação da culpa, é compatível com a presunção de inocência determinar, em certas hipóteses, o cumprimento da pena, ainda que pendente de recursos (especial e extraordinário). Lançando todas essas premissas naquele julgado, entendi que o início de cumprimento da pena não dependia do trânsito em julgado da condenação. Havia a possibilidade de imediata execução. Repita-se, sempre dissemos que a prisão seria uma possibilidade jurídica, não uma obrigação. Contudo, penso que a conclusão daquele julgamento no HC 126.292, na linha da argumentação que desenvolvi, poderia ter sido outra. Explico: analisadas diversas situações concretas resultantes daquele julgado, em que tribunais, automaticamente, passaram a determinar a antecipação da execução da pena, verifiquei, e acredito que todos os meus pares também, a ocorrência de encarceramentos precoces, indevidos, em razão de reforma posterior da condenação pelo STJ. São situações em que, iniciada a execução antecipada da pena a partir do julgamento de segunda instância, esta vem a ser, em recurso especial ou habeas corpus, reduzida com mudança de regime (para o aberto), ou suplantada pela absolvição ou pela extinção da punibilidade pelo Superior Tribunal de Justiça. A título de exemplo, vejamos concretamente alguns casos em que se mostrou indevido o início do cumprimento de pena de prisão imediatamente após a apelação: 1) Na ação penal 0104654-76.1995.403.6181, da Justiça Federal de São Paulo, réu condenado a 5 anos de reclusão, regime semiaberto, teve a sentença confirmada pelo TRF/3ª Região, deflagrando-se automaticamente o início do cumprimento da pena. Porém, em habeas corpus impetrado no STJ (HC 317.330/SP), a pena foi reduzida para 4 anos de reclusão, sendo alcançada pela prescrição. 2) Réu condenado e a sentença mantida pelo Tribunal à pena de 5 anos de reclusão, regime inicial fechado, dando-se automaticamente o início do cumprimento da pena. Em agravo em recurso especial no STJ (AREsp 1.195.573-SP), entretanto, a pena foi reduzida para 1 ano e 8 meses de reclusão, regime aberto, sendo a reprimenda substituída por pena alternativa. 3) No terceiro exemplo, a alforria do réu veio de embargos declaratórios em agravo tirado de recurso especial analisado pelo STJ (977.341-MG). Aqui o réu foi condenado a uma pena de 2 anos e 6 meses de reclusão, regime inicial fechado. Deu-se a execução da pena após condenação em segunda instância. O STJ reduziu para 1 ano e 8 meses de reclusão e, diante do quantum aplicado, reconheceu a prescrição. Observe-se que, em todos esses exemplos, os réus respondiam soltos aos respectivos processos. A expedição de mandado de prisão deu-se automaticamente, em razão da simples confirmação da condenação em 2ª instância a partir da leitura errônea que se deu ao entendimento sufragado por esta Corte. A possibilidade virou obrigação! Em outros termos, diante das decisões do STJ, os réus cumpriram penas indevidamente e foram presos ilegalmente!!! Situações como essas acabam reforçando a posição daqueles que defendem o trânsito em julgado definitivo como única hipótese de se antecipar o início do cumprimento de pena, dentre eles destaco Lenio Luiz Streck, para quem (Consultor Jurídico ht tps://www.conjur.com.br/2018-abr-02/streck-presuncao-inocencia-10- pontos-nao-jejuar tps://www.conjur.com.br/2018-abr-02/streck-presuncaoinocencia-10-pontos-nao-jejuar): “o sistema jurídico sofrerá um retrocesso e o sistema prisional entrará em colapso, além de sufragar prisões de pessoas sem antecedentes e/ou que foram condenados por prova ilícita ou probabilismos e teses exóticas que começam a vicejar nesse neopunitivismo” Por essa razão, essas prisões automáticas em segundo grau, que depois se mostraram indevidas, fizeram-me repensar aquela conclusão a que se chegou no HC 126.292. E, tudo poderia ter sido diferente se mudássemos tão somente o marco a partir do qual deveria ser iniciado o cumprimento da pena. nos habeas corpus de minha relatoria, quando cabível, ordem para impedir a imediata execução de pena em condenações confirmadas em segunda instância, sendo exemplos, o HC 142.376, decisao de 11.5.2017, DJe 15.5.2017; HC 147.953– MC, decisao de 19.10.2017, DJe 23.10.2017; HC 147.981/SP–MC, decisao de 6.10.2017; HC 148.822/SP–MC, decisao de 18.10.2017, DJe 20.10.2017; HC 150.553-MC, decisao de 23.11.2017, DJe 27.11.2017; HC 153.480-MC, decisao de 1º.3.2018; HC 150.226-MC, decisao de 5.12.2017, DJe 12.12.2017; HC 147.764-MC, decisao de 21.9.2017, DJe 26.9.2017; HC 146.818-MC, decisao de 18.9.2017, DJe 20.9.2017; HC 146.815-MC, decisao de 22.8.2017; DJe 24.8.2017. Saliento que, apesar de ter concedido ordens de habeas corpus amparado na impossibilidade do cumprimento antecipado, deneguei a ordem no HC coletivo 154.322, a mim distribuído recentemente, em razão da amplitude do pedido, que era genérico, com a pretensão de suspender todas as execuções antecipadas da pena até o julgamento do mérito da ADC 44. Destaquei, entre outros fundamentos, que a concessão da ordem “geraria uma potencial quebra de normalidade institucional”. JULGAMENTO PELO STJ: O NOVO MARCO Destarte, entendo que, estabelecendo-se marco mais seguro, poderíamos manter as linhas gerais do entendimento instituído no HC 126.292. Antes disso, o progressivo tratamento mais gravoso, de acordo com o estágio do processo, poderia antecipar a execução da pena, segundo análise caso a caso, em situações excepcionais, que serão vistas adiante. Com efeito, o princípio vigente de que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da condenação, não é absoluto. Estabelece o art. , inciso LVII, da Constituição Federal, in verbis: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A literalidade do referido dispositivo prestigia a orientação no sentido da exigência de trânsito em julgado para que se proceda à execução da pena, estando no espectro dessa preclusão maior, na linha do que ficou estabelecido no HC 126.292, dispensar-se tratamento mais gravoso ao réu na mesma medida em que avança o processo com a condenação pelas instâncias soberanas de análise dos fatos. Daí ter aderido, em um primeiro momento após o julgamento daquele HC, ao entendimento inaugural do Ministro Dias Toffoli na ADC 43, no sentido de que o início da execução da pena deveria aguardar o julgamento do recurso especial (ou AResp) pelo STJ. No âmbito de sua competência, como os casos citados demonstraram, o STJ pode corrigir questões relativas à tipicidade, antijuridicidade ou culpabilidade do agente, alcançando inclusive a dosimetria da pena. Destaco o seguinte excerto do voto do Ministro Dias Toffoli: “Com efeito, para além dessas questões fáticas, a certeza na formação da culpa deriva de um juízo de valor sobre a tipicidade, a antijuridicidade da conduta e a culpabilidade do agente, bem como sobre a própria sanção penal a ser concretamente imposta, atividade que pressupõe o estabelecimento: i) das penas aplicáveis dentre as cominadas; ii) da quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; iii) do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e iv) da substituição da pena privativa de liberdade por outra espécie de pena, se cabível (art. 59, CP). Ora, não há dúvida de que a enunciação desses juízos de valor está reservada ao Superior Tribunal de Justiça, em razão da missão constitucional que lhe foi outorgada de zelar pela higidez da legislação penal e processual penal e pela uniformidade de sua interpretação”. (ADC 43 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgada em 5.10.2016) Anote-se que, no referido habeas (HC 126.292/SP), esta Corte assentou que, esgotadas as instâncias ordinárias, a interposição de recurso especial não obstaria a execução da pena de prisão estabelecida na decisão penal condenatória. E, diante disso é que o Ministro Dias Toffoli votou no sentido de que a execução da pena deveria ficar suspensa com a pendência de recurso especial ao STJ, mas não de recurso extraordinário ao STF. Para fundamentar sua posição, sustentou que a instituição do requisito de repercussão geral dificultou a admissão do recurso extraordinário em matéria penal, que tende a tratar de tema de natureza individual, e não de natureza geral, ao contrário do recurso especial, que abrange situações mais comuns de conflito de entendimento entre tribunais. Acresça-se que aguardar o trânsito em julgado, diante da sistemática da repercussão geral, seria alongar indefinidamente a solução judicial, incentivando o uso desmensurado do recurso extraordinário. É importante citar a redação do art. 637 do CPP, ainda em vigor: “Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença”. Ressalte-se, também, que a objetivação (dessubjetivação) do recurso extraordinário possui importante fator a ser considerado nessa imbrincada temática, tendo em vista que, na prática, os recursos extraordinários, na imensa maioria das vezes, aguardam indefinidamente para serem julgados, com possibilidade, inclusive, de sobrestamento nacional de todos os processos correlatos (§ 4º do art. 1029 do CPC).

    conformação e desenvolvimento da cultura jurídica constitucional. Não é uma ideia distante daquela desenvolvida por Karl Larenz, em sua aclamada Metodologia da Ciência do Direito, na qual aborda os chamados métodos de desenvolvimento judicial do direito. O autor destaca: “Se bem que a interpretação da lei constitua a tarefa imediata de uma Jurisprudência dirigida à prática jurídica, a Jurisprudência contudo nunca se esgotou nisso. Sempre se reconheceu que mesmo uma lei muito cuidadosamente pensada não pode conter uma solução para cada caso necessitado de regulação que seja atribuível ao âmbito de regulação da lei; por outras palavras: que toda a lei contém inevitavelmente «lacunas». Igualmente se reconheceu desde há muito a competência dos tribunais para colmatar as lacunas da lei. É, portanto, um desiderato importante da Jurisprudência pôr à disposição do juiz métodos com ajuda dos quais ele possa cumprir esta tarefa de modo materialmente adequado e conclusivo. Mas, por vezes, não se trata só no desenvolvimento judicial do Direito de colmatar lacunas da lei, mas da adopção e conformação ulterior de novas ideias jurídicas que, em todo o caso, se tinham insinuado na própria lei, e cuja realização pela jurisprudência dos tribunais vai para além do plano originário da lei e o modifica em maior ou menor grau.” (Metodologia da Ciência do Direito, p. 519). Portanto, dentre as possibilidades de se aguardar uma eternidade até o julgamento definitivo da condenação em recurso extraordinário, e a execução imediata (e automática) da pena pelo tribunal de apelação, o julgamento pelo STJ constitui medida (possibilidade) mais segura. Esse novo marco, com o fim da prisão automática no segundo grau, consubstancia apenas um ajustamento do momento inicial para a execução da pena, mais consentâneo com o nossa ordenamento jurídico e a com a nossa realidade. Não se altera a essência do entendimento majoritário desta Corte estabelecido no HC 126.292, de esgotamento das instâncias soberanas na apreciação dos fatos para se considerar imutável a condenação, apenas muda-se o marco. TRÂNSITO EM JULGADO PROGRESSIVO A propósito, o sistema italiano estatui, nos termos dos arts. 648 e 650 do Codice di Procedura Penale, que as sentenças penais são executáveis (obrigatoriamente) no dia do julgamento pela Corte de Cassação (equivalente ao nosso STJ). Essa a dicção literal dos preceptivos: “Articolo 648. Irrevocabilità delle sentenze e dei decreti penali. 1. Sono irrevocabili le sentenze pronunciate in giudizio contro le quali non è ammessa impugnazione diversa dalla revisione. 2. Se l'impugnazione è ammessa, la sentenza è irrevocabile quando è inutilmente decorso il termine per proporla o quello per impugnare l'ordinanza che la dichiara inammissibile. Se vi è stato ricorso per cassazione, la sentenza è irrevocabile dal giorno in cui è pronunciata l'ordinanza o la sentenza che dichiara inammissibile o rigetta il ricorso. 3. Il decreto penale di condanna è irrevocabile quando è inutilmente decorso il termine per proporre opposizione o quello per impugnare l'ordinanza che la dichiara inammissibile. (...)” “Articolo 650. Esecutività delle sentenze e dei decreti penali. 1. Salvo che sia diversamente disposto, le sentenze e i decreti penali hanno forza esecutiva quando sono divenuti irrevocabili. 2. Le sentenze di non luogo a procedere hanno forza esecutiva quando non sono più soggette a impugnazione”. O modelo italiano tem ainda outra regra bastante interessante, ao admitir a formação progressiva do trânsito em julgado. Havendo uma pena mínima (líquida) já com trânsito em julgado, dá-se início à execução. São hipóteses em que, exemplificativamente, a sentença condena o réu em dois crimes (furto e receptação), mas a apelação volta-se apenas contra um dos delitos. Executa-se a parte não recorrida. “Articolo 624. 1. Se l’annullamento non è pronunciato per tutte le disposizioni della sentenza, questa ha autorità di cosa giudicata nelle parti che non hanno connessione essenziale con la parte annullata. 2. La Corte di cassazione, quando occorre, dichiara nel dispositivo quali parti della sentenza diventano irrevocabili. L’omissione di tale dichiarazione è riparata dalla Corte stessa in camera di consiglio con ordinanza che deve trascriversi in margine o in fine della sentenza e di ogni copia di essa posteriormente rilasciata. L’ordinanza può essere pronunciata di ufficio ovvero su domanda del giudice competente per il rinvio, del pubblico ministero presso il medesimo giudice o della parte privata interessata. La domanda si propone senza formalità. 3. La Corte di cassazione provvede in camera di consiglio senza l’osservanza delle forme previste dall’articolo 127”. Perceba-se, o trânsito em julgado progressivo está em sintonia com o entendimento desta Corte, esposado no aludido HC 126.292, ao estabelecer a definitividade da condenação com o esgotamento do debate sobre aspectos fáticos da imputação. Não recorrendo o réu de alguma das penas aplicadas, ou apelando para discutir outras questões, passa-se a ter a chamada pena mínima exequível – “il giudicato può avere una formazione non simultanea, ma progressiva”, formação de coisa julgada progressiva, não simultânea. A execução parcial da sentença não é um instituto por nós desconhecido. Integra nosso arcabouço jurídico, estando assentado no Código de Processo Civil sobre a execução por capítulos da sentença, conforme dicção dos arts. 509, § 1º, 523, 975 do CPC, que autorizam a execução da parcela incontroversa da sentença. Com essa ótica, não parece incompatível com a presunção de não culpabilidade que a pena possa ser cumprida, independentemente da tramitação do recurso, quando parte da condenação tornou-se incontroversa. Na mesma linha da formação progressiva do trânsito em julgado da condenação, podemos situar questões precipitadas em habeas corpus, impetrado paralelamente à interposição de recursos extraordinários (especial e extraordinário). A prática forense tem demonstrado a utilização de forma meramente estratégica do sistema recursal, como meio para se adiar o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. A discussão real acaba sendo deflagrada, com amplitude, em habeas. As questões colocadas no remédio heroico consubstanciariam o continente em relação àquelas matérias lançadas em sede recursal. Existem casos emblemáticos que bem ilustram o mau uso da via recursal para fins de se atingir a impunidade, frustrar a aplicação da lei penal. Todos os dias nos deparamos, aqui, com essa multiplicidade de agravos e embargos de declaração como instrumentos impedientes do trânsito em julgado, que muitas vezes levam também a esse fenômeno da imposição da prescrição. Essa observação, aliás, já havia feito no HC 126.292. Por essa razão, deve-se dar alguma consequência prática ao julgamento antecipado da causa por meio do habeas corpus. Não se está fechando as portas ao remédio heroico, mas uma vez analisada a matéria nele tratada, normalmente ainda mais abrangente que o conteúdo dos recursos extraordinários, torna-se despiciendo aguardar o julgamento destes (caso venham a ser admitidos). A defesa decidiu queimar etapas fazendo uso de habeas corpus.

    Obs. Devido a limitação de caracteres, deixo o link na integra do voto, não deixe de ler.

    http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC152.752VOTOGM.pdf

    www.escritoriodedireito.com

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